Não me interessa ser “sequestrado” para uma discussão sobre um assunto (o investimento no Estádio) que, sendo importante no processo eleitoral autárquico, não pode monopolizar a atenção pública. Basta a monopolização dos recursos financeiros da Câmara.
No entanto, não posso deixar passar esta oportunidade de aprofundar a troca de impressões com o actual Presidente de Câmara, agora mais cordial (a democracia e os munícipes agradecem), esclarecendo alguns pontos já abordados no comunicado de Francisco Vaz da Silva, para que tod@s percebam qual é a diferença de fundo entre a posição do Bloco de Esquerda e a do Dr. Alberto Souto.
Quem disse asneira foram vocês ao comparar o que não podia ser comparado: o custo abstracto sugerido pela UEFA (200contos /30 mil lugares) com o custo final de uma empreitada que praticamente não teve desvios.
Lamento discordar profundamente. E que se perceba: não é uma discórdia técnica (contabilística ou de gestão de obra), é uma discórdia política.
Até porque a discussão técnica é um fait-divers labiríntico e estéril: temos os mesmos números e sabemos o que é que eles significam.
Um caso típico de “você sabe que eu sei que você sabe…”
Politicamente (e é essa responsabilidade que lhe atribuímos) é de uma irresponsabilidade a toda a prova dizer que os custos de referência da UEFA são uma indicação abstracta e pouco importante. Não se pode fazer de conta que não foram esses mesmos custos de referência que serviram para a elaboração dos contratos-programa e para a definição dos apoios da Administração Central, e que estiveram na base de todas as considerações sobre a viabilidade da “aventura” do Euro2004. Foi com esses custos de referência que o Estado, os Clubes e as Autarquias embarcaram num projecto faraónico, para o qual pediram o apoio de todos os portugueses.
É contra esses custos de referência que temos que comparar o investimento que foi efectivamente realizado e, face à diferença, avaliar que outras mais-valias para o futuro apresentam os projectos, que justifiquem preços superiores aos de referência.
É que ninguém pode aceitar sem estranheza que a construção de um estádio de futebol seja inerentemente mais cara em Portugal do que noutro país europeu (é a isso que os custos de referência se referem). Ninguém pode aceitar essa diferença sem se pôr a cogitar sobre o destino do investimento extra.
Serão os operários de construção civil muito mais bem pagos em Portugal do que no resto da Europa? Serão os projectistas mais exigentes nos honorários e nas especificações? Serão os materiais significativamente mais caros?
Nenhum dado concreto suporta alguma destas teorias…
Resta então procurar as mais-valias dos projectos face às referências. Onde é que elas estão no caso de Aveiro?
Descanse o executivo camarário aveirense, porque esta nossa inflexibilidade (que é partilhada pelo Tribunal de Contas) face à importância dos custos de referência, se transforma em acusação a todos os executivos camarários que, no resto do país tiveram a mesma visão. Caso a caso, procuramos as mais valias para as cidades e seus habitantes de cada Euro investido nestas obras. Nesta irresponsabilidade o executivo aveirense está bem acompanhado.
Resta saber até onde vai a teimosia desta defesa do indefensável.
Espero que assim fique claro porque é que não corrigimos nem corrigiremos as nossas afirmações.
Nem sequer no que diz respeito à afirmação de que em Aveiro, como noutros pontos do país, a deriva do investimento público em projectos desta natureza só pode ser explicada por enriquecimento indevido. E sejamos claros: quando falamos de enriquecimento indevido não estamos necessariamente a falar de corrupção. Estamos a falar do inflaccionamento artificial de despesas, de orçamentação pouco rigorosa, de ajustes directos na subcontratação, de fiscalização ineficiente… problemas que nos habituámos a identificar como “fatalidades da obra pública em Portugal”. Situações contra as quais o Bloco de Esquerda se pronuncia e pronunciará em todos os momentos e locais. Situações que têm merecido críticas repetidas do Tribunal de Contas. Situações que constituem um dos sintomas mais reconhecíveis da famosa “crise de regime” que atravessamos, na opinião de políticos de vários sectores, autarcas e empresários, jornalistas e opinion-makers…
Reagir a estas afirmações com ares de madonna ofendida não convence.
Podemos então passar a outro assunto?
Quer escolher?
4 comentários a “Para passar ao assunto seguinte”
Chamaram-me a atenção para uma gralha na citação de Alberto Souto que pode prejudicar a compreensão dos valores. O cálculo dos valores de referência da UEFA é aproximadamente 200 contos x 30 mil lugares (os 30 milhões de euros) e não 200 contos/30 mil lugares.
É apenas uma gralha (do texto original) que passou incólume na escrita da mensagem por distracção.
A quem se tiver baralhado, as minhas desculpas.
João
Gostei, muito bem!
Francisco
Nao branqueie as afirmações que tao bem soube concordar.
Faça-se homem e assuma, se acha que se puseram dinheiros no bolso diga.
Sinceramente, o que mais me incomoda nestes anónimos é o facto de nem sequer saberem escrever!