Estamos todos fartos do paleio politicamente correcto do “bio-isto” e do “eco-aquilo” e o cínico que há em cada um de nós desespera sempre que ouve falar da possibilidade de salvar o mundo separando o lixo ou apagando a luz do “standby” das televisões. É verdade. Mas também é verdade que é preciso ser um selvagem a viver no meio duma gruta ou um grunho neandertal para não sentir a pressão social que existe para que, pelo menos a utilização dos ecopontos (a separação do lixo) se generalize e, excepção feita aos locais onde esses equipamentos escasseiam (queixem-se disso aqui, por favor), nota-se alguma mudança de comportamentos e a vergonha (ou uma consciência ambiental real?) faz com que seja cada vez mais natural não gostarmos de ver imagens como esta:
Não é raro, bem sei, mas começa a despertar em todas as pessoas um incómodo natural, talvez até mesquinho, do tipo “então eu ando a separar e transportar a porcaria dos recicláveis e há uns espertos que os pousam aqui no chão e que se lixe?”
Em alguns sítios e em algumas alturas, estamos quase dispostos a não dar grande importância, mas quando isso acontece de forma continuada e sistemática, damos por nós a olhar à volta e a pensar “mas quem é o bronco que faz isto?”. Pensamos nos nossos vizinhos, pensamos nos patrões e empregados das lojas que vemos carregarem caixas e desempacotarem mercadorias…
Pior ainda é se abrirmos o tal contentor e encontrarmos alguma coisa parecida com isto:
O contentor do lixo não tem sequer espaço para o nosso lixo (que é mesmo lixo) porque alguém— agora há cada vez menos potenciais broncos na vizinhança e os olhos concentram-se nas caixas para perceber se são as sapatarias ou a loja de electrodomésticos a ganhar a luta da falta de civismo— decidiu que o Ecoponto mais próximo é muito longe. Alguém, perceba-se isto, que não tem sequer que fazer nenhuma separação de lixo, já que tem apenas recicláveis (plástico e cartão) e que acha que é razoável usar o contentor do lixo indiferenciado que tem à porta (ou à montra), em vez de fazer o percurso que eu faço para depositar os despojos da operação de descarga. Alguém que muito provavelmente tem ou já teve na sua montra destaque às características “eco-isto” ou “bio-aquilo” dos produtos que vende.
E um gajo começa a ferver.
“Ferves em pouca água”, dizem vocês. “Se calhar levar aquilo tudo para o Ecoponto ainda é uma grande chatice que demora imenso tempo e é preciso é ser produtivo e, além disso, os Ecopontos estão quase sempre cheios, seja como for”.
Então olhem lá para este esquema, para perceberem porque é que eu fervo:
Tudo isto se passa em Aveiro, na Rua Mário Sacramento, junto à Rotunda do Centro Comercial Glicínias (preferia chamar-lhe Rotunda do Eucalipto, mas já ninguém a conhece por esse nome). O “Ecoponto 1”, junto à PT Inovação é um Ecoponto normal e, de facto, está normalmente cheio, já que esta é uma área residencial algo densa e, vá-se lá perceber porquê, há muita gente a separar o seu lixo. Mas, a uma distância igual, com um acesso fácil a carros e tudo, há desde há uns meses, um Eco Drive (uma inovação da Câmara Municipal de Aveiro, segundo consta):
Cada estrutura destas é constituída por dois ecopontos completos, dois pilhões, um oleão, um contentor para deposição de resíduos eléctricos e electrónicos, um contentor para deposição de resíduos verdes, outro para deposição de resíduos de grandes dimensões (monos/monstros) e dois contentores para resíduos sólidos indiferenciados.
Está ali, mesmo à mão de semear, com acesso fácil, junto à Vila Jovem e ao antigo edifício da Escola Profissional de Aveiro e até tem um outdoor a publicitá-lo na Rotunda.
E, desde que o Eco Drive ali está, já me deparei com esta situação junto do contentor do lixo mais do que uma vez. Por isso, o que é que se faz nestas situações? Uma peixeirada (é aquilo que estou a fazer, digitalmente)? Uma acção pedagógica directa junto dos comerciantes? Pede-se apoio à Câmara ou à Junta de Freguesia ou à Sociedade Ponto Verde? Ou não se faz nada porque estas coisas dependem da consciência individual?
E se não dependessem? E se usar o Ecoponto, separar o lixo, fosse mais do que um simples acto de civismo? Adiantava alguma coisa?