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Ainda as piscinas do Beira-Mar

Desde que escrevi sobre o encerramento das Piscinas do Beira-Mar e o negócio dos terrenos tenho trocado algumas mensagens sobre o assunto com pessoas mais ou menos informadas e/ou interessadas e estava a preparar um conjunto de questões que me pareciam fundamentais para que se perceba a verdadeira natureza desta “operação”. Entretanto, a leitura deste artigo do Raúl Martins, faz-me corar de vergonha pelo município da minha cidade, dada a gravidade dos factos apresentados, mas creio que as minhas singelas questões ainda se justificam:

  1. O valor da venda dos terrenos ao Beira-Mar, 1.283.000,00€, pelo que se percebe desta notícia onde se cita Carlos Santos, resulta duma avaliação feita por um técnico contratado pelo executivo anterior, mas já durante este mandato. A referida avaliação foi submetida e aceite pelo executivo e pela Assembleia Municipal, mas, a acreditar nos factos relatados por Raúl Martins em que se admite a possibilidade do terreno valer mais do que 4 milhões de euros, ou, em alternativa, observando como num momento de crise económica séria, o mesmo terreno foi vendido por 2,5 milhões (quase o dobro do valor) no mesmo momento… observando o mercado, portanto, o mínimo que se pode dizer acerca desta avaliação e da sua aceitação pelo executivo e assembleia é que é ingénua, desfasada da realidade e, por isso, absurda e lesiva do interesse público. Vai ser chamado o técnico para explicar como é que se determinou este valor? Vale alguma coisa uma avaliação que não tem o mínimo contacto com a realidade do mercado?
  2. As restrições de uso destes terrenos constantes do protocolo assinado entre a CMA e o SCB poderiam eventualmente justificar disparidades na avaliação do seu valor imobiliário, caso se considerasse que o programa imposto não atraía investimento. Por isso, impõe-se perceber que instrumentos usou a Câmara Municipal para assegurar o cumprimentos do disposto no protocolo. Estão as restrições de uso (programa lúdico-desportivo subordinado à temática da água e com 2 piscinas, uma delas de 50m) inscritas em algum instrumento de ordenamento do território? Estão os proprietários dos terrenos, quem quer que eles sejam, forçados a cumprir a “parte do Beira-Mar” neste ponto do Protocolo? Que garantias pode o executivo dar à cidade (já que do Beira-Mar ninguém espera nada) de que os equipamentos previstos serão de facto construídos? Que punições prevê e/ou pode o executivo (este ou o próximo) aplicar, caso se verifique o incumprimento destas restrições de uso?
  3. Ninguém acha cruel ou, pelo menos de mau gosto que, no meio de todas estas “manobras”, a única piscina de 50 metros da cidade, a única piscina ao ar livre, aberta durante os meses de férias e usada por muitas pessoas da cidade, especialmente por jovens, tenha fechado as portas a 1 de Agosto, sem pré-aviso?

Perguntas simples, face à situação extraordinariamente grave descrita por Raúl Martins, mas cuja eventual resposta poderia ajudar a saber quem é que está de consciência tranquila. E o mais grave é que me parece que o recurso à Inspecção Geral das Autarquias Locais, por parte da CMA, não vai esclarecer nenhuma destas questões. Como já comentei um destes dias, talvez o Tribunal de Contas fizesse o favor de analisar este negócio, que não tendo a escala do negócio da Liscont é, sem dúvida, um “negócio ruinoso”.

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De quem são as piscinas?

Apesar do porte muito pouco atlético que ostento, fui atleta federado nos chamados escalões jovens, ou escalões de formação, durante muitos anos e em várias modalidades. Não só por não me distinguir em nenhuma, mas também porque a diversidade de práticas desportivas me era muito útil à saúde física e mental, pelo que uma parte significativa do que sou ou não hoje devo-o à prática desportiva formal, no Desporto Escolar, na Escola do Clube de Ténis de Aveiro, nas Escolas de Natação do São Bernardo e no Sport Clube Beira-Mar, onde pratiquei patinagem, ginástica, basquetebol e andebol. Fora dos clubes, em família, a prática desportiva informal também foi muito importante, por exemplo, para desenvolver o gosto pela corrida, pelo ciclismo e pela natação, as 3 vertentes do triatlo que é, neste momento, o meu projecto desportivo “pessoal”, mas os desportos de equipa, por um lado e a natureza das relações hierárquicas que a prática formal exige, por outro, ajudam-me a olhar para o fenómeno do desporto organizado em clubes e colectividades como algo de absolutamente necessário, ainda que, por estas alturas, extensivamente infectado de péssimos exemplos.

Vem isto tudo a propósito da notícia recente do encerramento do Complexo de Piscinas do SC Beira-Mar e da escandalosa venda do terreno onde elas se encontram a um promotor imobiliário: o clube vendeu o terreno por 2,5 milhões de euros no mesmo dia em que o comprou à Câmara Municipal de Aveiro, por 1,28 milhões de euros, de acordo com esta notícia.

A venda é escandalosa por 2 razões diferentes:

  1. a quase duplicação do valor indicia que o negócio da dupla transacção lesa claramente os interesses e os cofres públicos, ao favorecer os interesse e cofres do clube desportivo
  2. a inexistência de garantias, por parte do clube, do cumprimento do Protocolo celebrado com a Câmara, no contexto do qual a transacção se efectuou e que se destinaria a salvaguardar o interesse público e a manutenção de uso do terreno, aprofunda a sensação de que tudo se tratou duma manobra de encaixe de capital, com terrenos de grande valor urbanístico a serem entregues à especulação

Estas questões são levantadas, e bem, pela candidatura do PS à Câmara de Aveiro e, se o primeiro ponto não carece de argumentação (é factual), a verificação do segundo ponto requer apenas a leitura do comunicado do Beira-Mar:

Paralelamente, continuamos a trabalhar com a CMA, no âmbito da implementação do Protocolo no sentido de se concretizar a construção das novas Piscinas.

Ora, a parte da CMA no que concerne às Piscinas, pelo que se percebe do protocolo, está feita:

Transferir para o SCBM, ate ao dia 31 de Dezembro de 2008, a propriedade total do prédio onde se encontra implantado o Complexo Desportivo de Piscinas, sito na Rua das Pombas, em Aveiro, através da competente escritura pública de compra e venda, pelo preço da avaliação patrimonial de 1.283.200,00 € (um milhão duzentos e oitenta e três mil e duzentos euros) constante do inventário municipal e com a capacidade construtiva máxima de doze mil metros quadrados de implantação com 3 pisos acima do solo e cave, para nele ser edificado equipamento comercial-lúdico-desportivo, subordinado à temática da água, que deverá compreender obrigatoriamente a construção de duas piscinas.

É certo que, infelizmente e ao contrário do que acontece com os prazos estipulados para a construção do Centro de Treinos, no caso das Piscinas a Câmara não obriga o Clube a cumprir qualquer prazo, mas a condição da transacção é clara. E só essa condição poderia justificar uma operação de alienação de património público desta natureza.

Em boa verdade, o que aqui está em causa é uma enorme confusão sobre a propriedade das piscinas. Construiu-as o Beira-Mar, em terrenos da Câmara. Nelas nadaram atletas de vários clubes (de todos os clubes, de facto, enquanto as Piscinas do INDESP estavam em obras), nelas se organizaram provas, algumas bem importantes e que justificavam o facto de se ter uma piscina olímpica descoberta em Aveiro. Delas usufruiu toda a população, atletas ou não, desde os bébés nos primeiros contactos com a água, aos mais idosos praticantes de hidroginástica, passando por nadadores de todas as idades, classes, condições e interesses. É por isso que seria bom pensar que as piscinas, de facto, não são nem do Beira-Mar, nem dum Executivo Camarário: são das pessoas. E são as pessoas que estão neste momento a ser “roubadas”, sem qualquer tipo de escrúpulo e por gente que usa um pobre disfarce dum negócio inexplicável, mas que ficará sempre mal atacar porque um dos aparentes beneficiários é a instituição de utilidade pública SC Beira-Mar. Pois para mim, o estatuto de utilidade pública tem que ser merecido dia-a-dia, e o SC Beira-Mar há muito que o perdeu, como todos os pequenos clubes sem visão estratégica de sustentabilidade, que deveriam ter percebido que o seu único papel defensável é a promoção do desporto e da vida saudável junto das populações que servem e não o alimento do circo cruel e insaciável do “desporto profissional”, especialmente o dito “desporto-rei”, que sequestra as energias e as finanças dos clubes em negócios demasiado próximos do tráfico de humanos e nada compatíveis com a referida “utilidade pública”.

QUERO AS MINHAS PISCINAS DE VOLTA!